19/06/2007

Criação

Mais uma vez venho aqui no Bloguerreiros falar sobre criação. Mas dessa vez não sou eu quem vou deixar minha opinião, vou reproduzir dois textos que são muitos, mas muitos importantes para quem trabalha, ou sonha em trabalhar, com publicidade.
O Primeiro é uma entrevista de dois grandes nomes da publicidade brasileira, José Luiz Madeira e Marcello Serpa, ambos da AlmapBBDO, falaram sobre criação para o Meio & Mensagem. Congira abaixo:

Meio & Mensagem – Temos assistido recentemente a um intenso movimento das agências buscando um modelo ou um formato novo para atender as novas demandas do mercado, a chamada comunicação 360 graus. Qual é o posicionamento da AlmapBBDO em relação a essa realidade?

José Luiz Madeira – A Almap tem sido, nos últimos 14 anos, uma agência cheia de idéias. Mudamos para ficar no mesmo lugar que é na ponta. Eu trabalhei seis anos na Standard Ogilvy & Mather e esse negócio de 360 graus foi inventado há muito tempo pelo David Ogilvy, há 20 anos era inovação. Hoje é obrigação. A Almap começou trabalhando para cinco mídias (TV, rádio, jornal, revista e outdoor). Mas, em 1994, fizemos o primeiro “Zeppelin” voar para a Pepsi, em um momento no qual a marca precisava se diferenciar para concorrer com a Coca-Cola. Ou seja, fazemos comunicação integrada desde a reinauguração desta agência, em 1993. A diferença é que hoje existem 300 possibilidades diferentes além daquelas cinco de antes. O fato é que nós publicitários somos mestres – e alguns vão além da conta – de falar a mesma coisa com outras palavras.

Marcello Serpa – Essa é a diferença. Nós trabalhamos mais e discursamos menos. Às vezes se cria uma falsa percepção no mercado onde todo mundo, no discurso, diz que está fazendo um monte de coisas, mas não entrega direito. Toda hora tem alguém abrindo uma empresa nova. Somos agência de idéias e de trabalho. O que desenvolvemos para a Havaianas, por exemplo, é totalmente comunicação integrada, um case de absoluto sucesso para uma marca que hoje é global. Fazemos 360 graus no mundo inteiro para a Havaianas. De janeiro até agora, nós criamos seis campanhas para exportar para a marca, mais quatro só para o Brasil. Essa é a nossa vocação. Quem tem que aparecer aqui são os clientes, não somos nós. E eles, graças a Deus, têm aparecido bem.

M&M - Em Internet vocês chegaram a montar uma empresa dentro da Almap nesta área no passado.

Serpa – Chegamos a montar uma empresa de internet em 1995/96, a No Media que depois virou On Media. Depois veio a bolha e revimos o modelo. A internet foi crescendo e se tornou uma opção além das cinco básicas. Percebemos que não fazia mais sentido manter uma empresa em separado, mas sim desenvolver um conteúdo diferenciado que deve ser pensado desde o nascimento de uma idéia, e não atualizado depois que o conceito já foi criado. Hoje existem 35
pessoas dedicadas exclusivamente a essa mídia aqui dentro. Um exemplo desse trabalho é o que foi feito para a Antarctica, um case de relacionamento, um site da campanha dos bebedores oficiais de Antarctica, no qual era necessário chamar as pessoas para participar deste clube. Foi feito um site que tinha hino, estatuto, carteirinha, camiseta e uma lojinha. A pessoa entrava nele, colocava uma foto e imprimia a carteirinha. Foram feitas 120 mil carteirinhas, com nome, endereço, telefone, foto, uma base cadastral dessas pessoas nas classes C e D, que ninguém tem.

M&M – Com o crescimento das diversas formas de projetos executados pela agência a questão do preço e da remuneração se tornou mais complexa. Como vocês lidam com isso?

Madeira – Esse é um assunto polêmico, ruim de conversar no mundo inteiro. As agências estão quebrando por causa de um modelo que está sendo questionado em todos os lugares. Graças a Deus estamos em um country comission. Isso é um aprendizado de todos os dias. A publicidade é o core business aqui. Vivemos da composição de dois tipos de receitas – a vinda das comissões e a dos projetos especiais. É muito difícil cobrar isso, mas quando oferecemos
uma idéia para o cliente e ele se convence de que aquilo irá fazer a diferença fica mais fácil. Por isso que há dez anos nós abolimos o briefing aqui. Nós geramos o que fazer com ele. Para nós remuneração é conseqüência apenas.

M&M – Recentemente publicamos o resultado de uma pesquisa que diz que as agências dedicam 25% do seu tempo às concorrências e a Almap tem por princípio não participar deste tipo de seleção.

Madeira - Não damos o que vendemos. Nós dependemos de idéias para viver, se vendemos nossas idéias vamos morrer. Vendemos cada vez mais caro porque quando vendemos barato, nos arrependemos depois. Até aqui deu para nos manter desse jeito. Lutamos para não ter de voltar atrás. Há dez anos temos conseguido nos manter fiel a essa decisão. Não sabemos o dia de amanhã. Até aqui a agência tem sido procurada. E, quando você é procurado, você cobra o
seu preço. A nossa matéria-prima é perecível, é o tempo. E temos de usá-lo de uma maneira inteligente. O último processo pelo qual passamos, que não foi concorrência, foi com o Carrefour. Nunca tínhamos atendido varejo porque achávamos que um cliente desse setor seria ruim para a Almap. O Ricardo Lacerda (diretor de marketing da rede varejista) nos procurou e queria que
fizéssemos uma proposta de trabalho para atender a empresa. Demoramos um mês para dar a resposta, e acabamos fazendo uma proposta a ele – não apresentamos campanha. Eles aceitaram e desde então a comunicação do Carrefour alcançou níveis de satisfação e resultados nunca antes experimentados pela empresa.

Serpa - Normalmente, chegamos até a apresentação de credenciais apenas, porque muitas vezes a concorrência serve apenas para validar um processo interno do cliente, mas a decisão é tomada anteriormente.

Madeira – Somos ruins de relações públicas; não atendemos conta de governo – todo mundo sabe que se você se relaciona com a política consegue também contas da iniciativa privada. Está aí o Sr. Duda Mendonça para confirmar. É um absurdo o que esse cara fez e continua aí. Ele deveria ser banido da propaganda brasileira. É um mau exemplo; não participamos de concorrências; e conseguimos construir uma das carteiras de clientes mais invejáveis do
mercado. Ou seja, estamos no caminho certo. O desafio é continuar nesta posição a que chegamos.

M&M – A Almap construiu boa parte de sua percepção criativa com base em uma participação intensa em premiações. Este ano, a agência diminui em 80% as inscrições no Festival de Cannes. No ano passado, foi a agência que mais inscreveu peças (278) e voltou para cá com apenas dois Leões. Essa diminuição reflete uma queda na qualidade criativa do trabalho da agência?

Serpa – A Almap tem ganhado muita coisa desde 1996, quando recebemos seis Leões em Cannes. Em 2000, fomos a Agência do Ano em Cannes; em 2004, a agência mais premiada do Gunn Report, feito repetido no ano seguinte. Para manter esse patamar alto assim, é necessário inscrever muitas peças nas diversas categorias de todos os principais prêmios. Ao fazer a conta,
percebe-se que manter a performance criativa que tínhamos ficou completamente irreal. Quando nós ganhávamos tudo em Cannes, só tinha televisão e mídia impressa. Agora, só em Cyber tem 20 categorias. Financeiramente, ficou inviável inscrever-se em todas as categorias. O mundo
mudou. Além disso, países que antes não tinham muita expressão hoje estão se destacando. A Itália, que antes não fazia nada, ganhou o Grand Prix do Clio. Eu vi recentemente uma peça maravilhosa do Vietnã – ou seja, países dos quais há algum tempo você não ouvia falar nas premiações. Quando se fala que o Brasil vai mal, na verdade a questão é outra, diluiu, mudou o patamar. Quando vi o que ocorreu no ano passado em Cannes cheguei à conclusão de que
estávamos fazendo papel de bobo. Este ano, mesmo com essa diminuição temos trabalhos relevantes. O que vejo é que as peças que concorrem a prêmios não são de ponta. Hoje só nós e a F/Nazca fazemos isso. Na Almap, temos a oportunidade de exercitar o talento criativo em vários segmentos.

M&M – Qual a sua avaliação sobre o momento atual da criação brasileira?

Serpa – Acho que a propaganda nacional passa por um momento muito complexo; ela vive o Second Life. Ela não é real, é virtual. O momento atual é de ilusão completa. As pessoas estão se iludindo muito com o trabalho criativo que tem pouca relevância hoje fora de uma sala de júri. A criação brasileira está gastando toda a energia para falar com jurados e quase nada para falar
com o consumidor. Se você for hoje assistir ao rolo do Profissionais do Ano, com as peças que são veiculadas na televisão normal, você toma um susto enorme porque a qualidade é muito baixa. São pouquíssimas agências colocando um trabalho interessante no meio de um monte de porcaria, de fórmulas gastas, de filme com musiquinha, com pedaços de cenas vida, muito pouco
esforço em produzir um trabalho de ponta. Ou a propaganda brasileira volta a trazer sua energia para falar com o consumidor de uma maneira diferente ou ela vai morrer de inanição, porque lá fora as coisas estão mudando rapidamente.

M&M – Na sua opinião, a Almap está em um patamar diferente dessa sua análise?

Serpa – Acho cabotino ficar falando de mim mesmo, auto-elogio não vale, mas se você olhar o Prêmio Abril de 2006 (a agência ganhou o Grand Prix da última edição da premiação, realizada na quarta-feira, 30 de maio), oito dentre as dez finalistas eram peças nossas. No Anuário deste ano, você vai ver trabalhos para a Volkswagen, Havaianas. O Giba (Gilberto Reis, diretor executivo do Clube de Criação de São Paulo) me disse que eu deveria fazer um anúncio com todas as peças premiadas dizendo “isso você já viu antes, você não ver apenas quando o Anuário sair”!. Essa é uma percepção do mercado sobre o trabalho da Almap, não sou eu que estou dizendo. Nosso foco é o mesmo para o trabalho que colocamos na rua e o que colocamos em prêmio.

M&M – Essa visão leva a crer que os trabalhos inéditos criados para festivais devem diminuir?

Serpa – Não é uma questão de ineditismo. Eu gostaria que as grandes campanhas brasileiras premiadas nos festivais fossem as melhores que o País produzisse e não campanhas para restaurante, para academia. Imagina uma agência do tamanho da Almap e que só ganhasse prêmio com anúncios para esse tipo de cliente. Algo estaria errado. Temos que ganhar com trabalhos para Volkswagen, Pepsi, Mizuno, Havaianas. Em geral, trabalhamos com clientes
desse porte. É preciso vencer com as contas grandes. A Argentina está levando prêmios com campanhas para Coca-Cola, bancos, empresas de telefonia. Não é isso que está acontecendo hoje aqui. Ou os criativos caem na real - e vai ser uma queda dolorosa, porque haverá menos coisas premiadas, mas que serão factíveis - ou vai cada um lavar suas mãos e continuar tudo como está.

M&M – Você, Marcello, e a Almap são, respectivamente, uns dos profissionais e agência brasileira, mais premiados do Brasil da última década. Você alimentou muito essa questão da premiação...

Serpa – ...assim como o Washington (Olivetto) alimentou, como o Nizan (Guanaes) e o Fábio Fernandes também alimentaram. Só que o Brasil não está ganhando mais.

M&M – Mas o fato de você adotar esse discurso agora que o Brasil não vem ganhando mais prêmios como anteriormente não soa um pouco incoerente? Afinal, todo mundo hoje quer ser como você e sua agência por causa de uma visibilidade conquistada em grande parte por causa dos prêmios...

Serpa – Eu só quero que a propaganda brasileira ganhe mais. Para ela recuperar o poder que tinha nos anos 90 e no início desta década terá de mudar de atitude porque o mundo se transformou e nossas fórmulas ficaram antigas. A molecada está seguindo uma fórmula que não funciona mais. O que eu ou o Fabinho fizemos e ganhamos nos anos 90 e início dos anos 2000 já não era o que o Washington fez e ganhou nos anos 80, e agora essas mudanças são ainda maiores. Eu não estou dizendo “não façam fantasmas”, mas criar só fantasmas acaba fazendo com que você não saiba fazer propaganda de verdade. É claro que eu fiz fantasmas, mas havia também uma outra parte que era muito boa. Não é hipocrisia o que estou falando - é a realidade. As nossas fórmulas estão velhas. O que existe hoje é Havaianas, Skol e Claro ganhando prêmios. Cadê o resto?

M&M – Vivemos atualmente um momento em que o negócio da publicidade está sendo colocado em xeque por algumas frentes como o Tribunal de Contas da União (TCU) que está questionando o BV (bonificação por volume); a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e o Ministério da Saúde também querem aumentar as restrições à propaganda de bebidas alcoólicas. Qual sua
opinião sobre isso até porque a Almap tem entre seus clientes a cerveja Antarctica?

Madeira - Vejo isso com um sentimento de tristeza. A propaganda não pode carregar nas costas o que algumas entidades estão querendo imputar a ela. Em um país onde convivemos todos os dias com um vasto número de problemas, acho meio injusto que a publicidade fique nesta posição de tanta vulnerabilidade. Eu a vejo como uma ferramenta essencial de desenvolvimento econômico. A propaganda, direta ou indiretamente, é capaz de fazer com que as empresas
façam produtos e serviços melhores. O mundo vive o dilema dos exageros. Alguns matam gente e a propaganda está muito longe de produzir esse efeito. Os fabricantes de bebidas alcoólicas e o Conar tomaram a iniciativa de se auto-regulamentar e aumentaram as exigências que pautam a propaganda de bebidas há alguns anos. Eles olham para isso com muita seriedade e essa
atitude mudou o tom de comunicação do setor. Isso é algo louvável de quem está nesse meio, e você não ouve falar nada a respeito.

Serpa – Em nome de um suposto moralismo, está nascendo um fundamentalismo que é absolutamente intolerante. Existe a liberdade de expressão das marcas, elas podem anunciar o que fazem e empresas divulgam aquilo que produzem. Se é permitida a venda, deve-se permitir também o anúncio disso, lógico que dentro de algumas regras. Esse fundamentalismo é hipócrita também. Você tem uma série de coisas que é feita em qualquer país do mundo como restrição de consumo, tais como controle por meio de bafômetros. Eu tenho 44 anos de idade e nunca fui testado com bafômetro neste país. Ninguém nunca me parou para fazer um teste de álcool em alguma esquina. A venda de bebidas alcoólicas na estrada é permitida livremente. Ou seja, uma série de coisas que faz parte da tarefa do governo, das instituições para restringir, para educar não é feita e aí a culpa é 100% da propaganda? Acho isso uma injustiça sem tamanho. Hoje é tudo livre, tudo pode, menos anunciar. A mídia está sendo levada a cobrar dos publicitários algo que deveria ser cobrado do poder público.

M&M – Qual é seu o maior desafio na gestão de uma agência como a Almap? Madeira – É necessário mudar todo dia para continuar no lugar aonde você chegou. Essa é uma agência que tem um turn over baixíssimo – seja de clientes ou de pessoas. E o desafio é justamente mantê-la no patamar que ela conseguiu alcançar. Outro dia uma das minhas filhas me perguntou: “Pai, por
que você ainda trabalha?”. E eu falei: “Porque eu aprendo”. E existe uma superdiferença entre estudar e aprender. Aprender é sempre muito prazeroso. Aqui nós temos essa humildade de aprender e gerar algo que faça a diferença na guerra do dia-a-dia em que tudo é muito igual. Quando se diz que a propaganda está na berlinda, é preciso mais do que nunca fazer a diferença
via percepção. E como diria David Ogilvy, o importante não é o que você fala, mas o que as pessoas entendem. Enquanto todo mundo fala de conteúdo, nós, há três anos, fizemos a reedição do programa Carga Pesada, um case para a Volkswagen. Não somos agência de conteúdo, somos uma agência de comunicação, um banco de idéias.

Gostou da entrevista? agora você não pode deixar de ler um aritgo escrito por Daniel Xavier, do blog Midionauta. Segue:

"Eu estava para escrever este artigo sobre anúncios fantasma há algum tempo (para quem não é publicitário, "fantasma" é toda propaganda criada com o único intuito de ganhar prêmios e que não vai pra rua porque o cliente não a aprovou ou não a aprovaria). E, pegando carona no post abaixo, com a ótima frase do Marcello Serpa, resolvi tocar logo neste assunto tão horripilante, ao invés de esperar alguma rodinha de acampamento em volta da fogueira.

Em sua entrevista ao Meio&Mensagem, Serpa aponta, com muita propriedade, um problema crucial da nossa propaganda atualmente: “A criação brasileira está gastando toda a energia para falar com jurados e quase nada para falar 
com o consumidor”. Resumindo a entrevista, ele fala que a propaganda nacional (a veiculada, e não a que vai para os prêmios) hoje em dia é de baixa qualidade e que os criativos têm que se esforçar mais. É redundante dizer que ele está certo. Está certo quando aponta que “as peças que vão para a rua são criadas com fórmulas gastas”. Certo quando diz que “devemos focar a propaganda de verdade ao invés dos fantasmas”. Que “temos que ganhar prêmios com clientes grandes e não com restaurantes e academias” (tipo de cliente, geralmente, associado aos anúncios fantasmas). Mas ele falou apenas sobre uma parte do problema: aquela que se refere à competência e ao potencial criativo do profissional em relação às peças que vão pra rua. E seria muito bom se fosse só isso. Nada que um “pensa mais” não resolvesse. Mas a questão é um pouco mais complicada e a reclamação, bastante previsível quando vinda de nós, criativos: o cliente. Não é novidade levantar essa bola. Pode soar como desculpa para trabalhos ruins, mas não é. Este artigo não é um desabafo magoado. Com a humildade de quem escreveu e reescreveu esta frase inúmeras vezes para soar o menos arrogante possível, tive a sorte de colocar a maioria dos meus trabalhos premiados (infinita e eternamente em menor quantidade que Serpa) na rua. Inclusive, nem teria por que resmungar, uma vez que aqui, no Cartoon Network, nós somos o nosso próprio cliente. Assim como o presidente da Almap assume na entrevista, eu também tenho fantasminhas camaradas, das agências que passei, na minha pasta. Todos eles eu considerava premiáveis e foram jogados no lixo, sem muita explicação, pelos clientes. E é sobre estes anúncios que quero falar. Quero tratar, hoje, da quantidade de boas idéias jogadas fora, todos os dias, e não sobre aquelas que não foram pensadas, as quais Marcello Serpa já tratou excepcionalmente bem.

Houve um tempo em que o publicitário era visto como um visionário. Ele era respeitado e tratado como um especialista, mesmo não existindo tantas faculdades e cursos de portfólio. Era a época romântica da propaganda. Foi quando os robôs tomaram consciência da sua existência e assim começou a guerra entre humanos e máquinas. Surgiram os malditos cursinhos de MBA em marketing. E os pré-testes. E os departamentos de marketing dos anunciantes começaram a ser dominados por engenheiros e advogados recém-formados, que acreditam que mostrar trabalho é dizer “não” para a agência. Se embebedam com o poder ao encomendarem campanhas que não serão veiculadas; ao mudar os briefings após semanas de trabalho da agência; ao pedirem anúncios “pra ontem” que mofam nas suas gavetas depois de serem entregues. Ou, simplesmente, ao rejeitar uma campanha porque não gostam de verde ou dos dentes da modelo do layout. Quantas histórias incríveis podem ser contadas. É fato: as campanhas de verdade, premiadas e que ao mesmo tempo caem na boca do povo, são aquelas que possuem anunciantes ousados, atrevidos, irreverentes. Aqueles que acreditam e confiam no trabalho de suas agências. E esses clientes são geralmente os mesmos, como Havaianas e Volkswagen – já que estávamos falando da Almap – e talvez mais uma dúzia deles. E fechamos a lista. Uma porcentagem ridícula perto do número total. Tenho amigos, excelentes criativos, em grandes agências multi-nacionais, com grandes contas multi-nacionais, que passam meses sem colocar trabalho na rua, só fazendo alterações, num vai-e-vem que deixaria a Cicciolina entediada. Para no fim das contas, veicular um re-make da campanha gringa. Costumo dizer que trabalhar em criação é administrar frustrações. Ousaria chutar que para cada 10 trabalhos criados - com briefing - em todas as agências do Brasil, apenas 1 é veiculado. E de cada 10 trabalhos veiculados, apenas 1 sai como a gente gostaria que saísse. Isso é muito deprimente. E é aí que entram os anúncios, como diria Scooby Doo, fantaaaAAAAAAaaasmas. Eles não são a causa e, sim, a conseqüência. A válvula de escape. Que criativo não gostaria de colocar um trabalho maravilhoso na rua? Sou a favor da extinção do investimento em fantasmas mas acho que, para isso, devemos primeiro reeducar os clientes. Reconquistá-los. Que aqueles que estejam lendo este texto agora comecem esse êxodo, passem para o lado do bem e engrossem a pequena lista citada acima. Que assistam mais referências, que vejam mais anuários, que conheçam o que está sendo feito fora do Brasil. E quando, ao se depararem com um anúncio genial, não conseguirem segurar o sorriso, que criem em si mesmos a vontade de dar a mesma sensação ao seu público-alvo. O grande desafio do profissional de marketing é definir o foco, o briefing, o posicionamento que quer atingir. E esta não é uma tarefa fácil. Que os departamentos de marketing se concentrem nisso. Críticas construtivas serão sempre bem-vindas. Mas chega de palpites vaidosos e de reprovações covardes. Essa é a raiz da questão e é nela que devemos focar nossos esforços se queremos exorcizar as histórias de fantasma da nossa propaganda. E vamos terminar logo esse papo antes que você não consiga dormir de noite."

Acho que depois destes dois textos não preciso dizer mais nada. Deixem suas opiniões sobre o assunto.

Um comentário:

Daniel Xavier disse...

Fala guerreiro!
Uma honra ser citado por vocês aqui.
Gde abs,
:D